A necessidade de mudança no modelo comercial é pauta comum entre representantes do governo e de entidades do setor elétrico. O tema foi debatido em evento realizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) no final de maio. Contudo, há entre os grupos divergências em relação à velocidade de implantação da abertura do mercado.
Na avaliação da diretora de Programa da Secretaria Executiva do Ministério de Minas e Energia (MME), Camila Fernandes, o setor de energia passa por mudanças céleres e profundas no Brasil e no mundo. Como exemplo, a executiva citou o crescimento da micro e minigeração distribuída no País, que atingiu mais de um milhão de unidades, com quase 11 GW de potência instalada, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Fernandes credita que energia renovável e geração descentralizada já são uma realidade no Brasil, uma vez que a fonte hidrelétrica representou no passado 90% da matriz e hoje está em 56%. Diante desse cenário, a aprovação do Projeto de Lei (PL) 414 e do arcabouço normativo é absolutamente necessária.
Em sua fala, a executiva lembrou avanços legais e infralegais alcançados nos últimos anos, como o cronograma de abertura de mercado; a implantação do preço horário; critérios de suprimento, com o planejamento passando a considerar potência e energia; a solução transitória da Medida Provisória (MP) 998 (atual Lei 14.120) com o leilão de reserva de capacidade; e a retirada dos subsídios de novos projetos de fontes incentivadas, com transição, na geração e no consumo.
“A gente precisa de consenso, precisa de qualidade nesses estudos e tempo, que geralmente são critérios que se opõem. Mas mudar um normativo é uma necessidade para atender uma realidade que já se impõe no setor.”
Durante o debate do Ciclo de Palestras sobre Legislação e Políticas Públicas, o presidente do Ipea, Erik Figueiredo, disse que tarifas menores beneficiam os mais pobres, que comprometem aproximadamente 10% de sua renda com energia elétrica. E reforçou que uma tarifa mais barata só vai ser possível com um mercado mais aberto.
Na visão do CEO da 2W Energia, Claudio Ribeiro, é preciso resgatar consumidores pequenos que estão no mercado regulado e têm dificuldade de pagar suas contas de energia. Ribeiro acredita que a liberalização completa do mercado já deveria ter acontecido, que beneficiaria também empresários de menor porte que estão no limiar do Mercado Livre de Energia de Energia e não sabem que podem migrar. O benefício hoje desse mercado, frisou, vai para 10 mil grandes consumidores.
Abrangendo também números de investimentos do setor, Ribeiro lembrou que o ambiente livre responde atualmente por mais de 80% dos 45 GW em projetos de geração até 2026, com investimentos de R$ 150 bilhões. ”Se a gente não tomar medidas, teremos um apagão de investimentos no mercado regulado”, alertou, lembrando que o mercado que existe no Brasil para liberalizar é de 87 milhões de consumidores.
Segundo dados informados pelo diretor da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel), Bernardo Sicsú, pequenos e médios empresários foram responsáveis durante a pandemia por 70% dos empregos no Brasil. Sicsú afirmou que a conta de luz subiu mais que o dobro da inflação nos últimos sete anos, alcançando 237% do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Nesse mesmo período, os preços do Mercado Livre de Energia de Energia ficaram 25% abaixo do índice inflacionário.
A expectativa é de que o cenário se mantenha desafiador em 2022 e nos anos seguintes, uma vez que existem custos represados. Na avaliação do executivo, é possível abrir imediatamente o mercado sem gerar sobrecustos adicionais para o consumidor, pois é razoável a redução significativa de contatos com a descotização das hidrelétricas da Eletrobras e também de Itaipu, e usando ainda mecanismos para redução contratual como o de venda de excedentes pelas distribuidoras.
“O mercado, na nossa visão, poderia ser aberto amanhã. Não há razão para cercear o direito de escolha do consumidor. É possível abrir o grupo A até 2024 e todo o grupo B em 2026 sem gerar custos de sobrecontratação.”
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